Um sinal na rua do Universo
Há umas semanas fui ao Porto, à rua do Universo (se isso não é sinal de que se está prestes a assistir a algo de especial, podem desligar os radiotelescópios espalhados pelo mundo), para ser encantado pelo "Moving with Pina", que a própria autora, Cristiana Morganti, descreve como uma "conferência dançada". É uma forma intrigante de descrever um espetáculo, mas também muito precisa. É uma conferência, em que a Cristiana reconta, sozinha em palco, a sua experiência de trabalhar com a coreógrafa Pina Bausch, e é dançada porque está semeada de pequenos momentos de dança, protagonizados pela própria Cristiana, que servem para ilustrar algumas das deliciosas histórias que a bailarina tem para partilhar. O espetáculo é encantador, sobretudo para quem está familiarizado com a obra de Pina Bausch, mas também para quem, como eu, teve um contacto tardio com o seu universo a partir do filme "Pina", de Wim Wenders (já absolutamente recomendado aqui).
Feita a recomendação, passo ao recorte que eu queria realmente deixar aqui. A Cristiana contava, a dado ponto, como a Pina tinha uma atenção quase "sobrenatural" aos mais ínfimos gestos e movimentos dos bailarinos. E serviu-se de um exemplo curioso para mostrar isso. Uma das coreografias da Cristiana obrigavam-na a usar um vestido de época, em forma de balão, que lhe escondia totalmente as pernas e os pés. Foi para seu total espanto, portanto, que se viu na mira de uma observação da coreógrafa, durante um dos ensaios, sobre a forma como estava a manter as pernas abertas debaixo da enorme saia. A bailarina defendeu-se com o argumento que precisava de manter assim as pernas para conservar o equilíbrio, dado o peso do vestido. A resposta da Pina, que não cito exatamente igual, saiu incisiva e pronta-a-publicar em qualquer manual de life coaching: "Junta as pernas. A parte interessante do teu papel é esse, ver-te a lutar com uma dificuldade."
Obrigado, rua do Universo.