Saudades da Primavera
Lisboa (dá para acreditar?), abril de 2024.
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ideias e achados.
Lisboa (dá para acreditar?), abril de 2024.
Reparem na base da árvore, no quadradinho que a cidade lhe concede para poder crescer. Não sei dizer se é suficiente para uma olaia, mas a sua copa surpreendeu-me o olhar um destes dias, talvez por se ter "atrasado" em relação às suas companheiras de rua, já verdes. Na sua fragilidade, lembra uma árvore da savana africana que, ainda assim, é capaz de graciosidade. Fica aqui o registo da sua beleza. Tenho curiosidade (otimista) para saber como se desenvolverá nos próximos anos.
Lisboa, março de 2024.
Nunca apanhei tanta chuva a conduzir como naquele dia, mas valeu muito a pena ter percorrido a N263 até Odemira, especialmente a partir de Santa Luzia. Sem exagero, e para grande surpresa minha (que esperava uma zona mais árida, vá se lá saber porquê), pareceu-me uma das estradas mais bonitas que fiz até hoje (agora que penso nisso, arrependo-me de não ter anotada algures uma lista com estes caminhos), bordejada de muitas árvores e tons da primavera. Fica a recomendação e a promessa de um regresso (a pé, quem sabe).
Vi há uns dias, por acaso, o filme "A colina das papoilas", de Goro Miyazaki, e fiquei rendido. É um filme de animação onde a imaginação, claro, pode dar voos maiores, mas é uma obra-prima na forma como idealiza e pinta a presença da Primavera na história central.
Apetece entrar em algumas das cenas, nem que seja para descer a abrir aquela colina de bicicleta. Ando com papoilas no pensamento desde então, apesar de continuar limitado ao meu bairro, que pouco ou nada tem em comum com o litoral japonês. O espanto pareceu mais sentido, portanto, quando regressava a casa, esta semana, por um caminho diferente, e dou de caras com o que me ocorre descrever como uma ilha de Primavera na cidade — uma pequena encosta recém-transformada em jardim, por iniciativa da junta de freguesia, cheio de papoilas (sobretudo encarnadas, mas também algumas nos tons rosa e laranja) e de uma espantosa diversidade de outras flores.
É mesmo um pequeno festival de flores, tornado mais especial por surgir assim no meio urbano (fica adjacente à Segunda Circular), numa altura em que sair da cidade ainda não parece ser possível. Quem ali passa dificilmente fica indiferente à pequena mancha vermelha de papoilas e já há sinais de ser um espaço estimado por quem mora à volta. As abelhas e os shutterbugs da freguesia, pelo menos, têm ali um motivo novo para ficarem fora de si.
Estão por todo o lado, a começar pelas asas da borboleta branca da couve (Pieris brassicae), brancas à exceção de uma pinta escura. É uma espécie que começa a ser vista por esta altura do ano.
Nas amendoeiras, os sinais são botões.
Atualização 02/05/20: não se trata de uma amendoeira. Talvez uma ameixeira?
O amarelo vivo, mas indesejável (por ser considerada, nesta zona, uma espécie infestante), de uma acácia.
Além de sinais, também há notas musicais no ar. O senhor na fotografia aproveitou os últimos dias de sol para ensaiar, longe da cidade (e dos vizinhos), a sua flauta transmontana.
Por fim, o sinal mais inesperado. Li, há poucas semanas, na página de facebook do Parque Florestal de Monsanto, que já podiam ser vistas algumas orquídeas por lá. Não sabia da ocorrência de orquídeas silvestres nesta zona, mas a ideia de ter mais um desafio fotográfico à espreita foi irresistível. Não foi preciso procurar muito, pois lá estavam elas, muito pequenas e pouco vistosas, à beira de um dos trilhos que costumo percorrer. A espécie que encontrei, a Orphys Lutea, usa uma estratégia carnavalesca para assegurar a sua reprodução: as suas flores parecem-se com abelhas fêmeas para atrair polinizadores.