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horizonte artificial

ideias e achados.

O balanço de outubro

Uma experiência nova

Fui mesmo passar o dia a uma mesa de voto e contei como foi aqui no blog, logo no dia a seguir.

Viagem

Acabei por só conseguir ir a dois filmes do Festival de Cinema Francês e o que se destacou, para mim, foi mesmo este Gabrielle (2005), de Patrice Chéreau, que me despertou a curiosidade por adaptar para o cinema um romance de Conrad que já tinha lido, o The Return. É um filme quase tão intenso quanto o livro, com um ponto de vista diferente sobre o amor dentro do casamento.

Aprender

As aulas de desenho vão continuar mais algumas semanas e tem sido, é certo, desafiante. Pondo de outro modo, já passou algum tempo desde que me senti tão inepto numa atividade. Se o segredo para fazer algo melhor é praticar (e é mesmo), espera-me um longo e inclinado caminho pela frente.

Teatro

Comprei os bilhetes para a Ibsen House e arrependi-me no mesmo minuto, quando perguntei a duração: 3 horas. A minha zona de conforto, seja no cinema ou no teatro, acaba na marca das 2 horas. Fui preparado para o pior, mas não foi a seca gigante que a duração fazia prever. Continuo a achar que nenhum espetáculo precisa de pedir tanto tempo sentado ao seu público, mas foi curioso ver como a cenografia desempenha um papel central nesta peça, com uma casa a rodar 360º no palco.

Livros

Gostei muito do Jardins de Lisboa, de Ivo Meco, e quando gosto muito de um livro é porque me dá algumas ideias. Uma delas, pelo menos, diz respeito à fotografia: dei por mim a sair mais para a natureza para fotografar e a pesquisar os nomes das espécies que fui encontrando pelo caminho. Tenho mais algumas coisas em vista à volta deste livro, e partilharei por aqui se forem para frente.

Christine

Já repararam como escutamos/assistimos/lemos/provamos algo com mais atenção quando nos é recomendado por alguém? Eu sei que isto pode soar um bocadinho óbvio, mas sinto que é algo que se tem vindo a perder na era das recomendações automáticas (no Spotify, Youtube, etc).

Prova A: este texto da Vanessa sobre o teledisco Christine dos Christine and the Queens, lançado em 2014:

Neste vídeo a nossa perspectiva é desafiada. As imagens captadas revelam o desejo de movimento em sintonia com o movimento dançado pelos bailarinos, como se a câmara por vezes dançasse juntamente com eles.

É mesmo um vídeo e tanto, duplamente surpreendente por poder ser descrito como mostrando apenas algumas pessoas a dançarem em cima de um estrado. Como a Vanessa dá-se conta, é uma coreografia que tem a câmara como parceira de dança.

Falo disto aqui porque li o texto da Vanessa no início do mês e a música ainda não me saiu do ouvido ao fim deste tempo todo. O meu nível de francês ainda não me permite destrinçar a letra (foi uma surpresa total, por exemplo, descobrir que a canção começa por Je commence un livre par la fin) e fazer uma ideia completa sobre o seu sentido, mas aos meus ouvidos soa como um jogo distraído de palavras e sonoridades, que depois o teledisco leva um bocadinho mais longe, dando-lhe uma dimensão espacial. Já li nos comentários do Youtube o palpite de quem acha, algo inesperadamente, que pode referir um episódio de violência doméstica. Na Wikipédia, a autora é citada a contar que se trata de "uma canção fácil com um tema difícil" sobre alguém que se sente fora do seu lugar.

Seja qual for o sentido que lhe queiramos dar, sinto que se trata de uma canção que ganha mais vida com o seu teledisco. Sigam a recomendação, e julguem por vós próprios (só não me culpem depois, se ficar no ouvido durante semanas).

Outono em Monsanto

Campainhas

Senti-me inspirado pelo blog que descobri na semana passada a partir à procura dos sinais do Outono num dos meus sítios preferidos da cidade, o Parque Florestal de Monsanto. A palete de cores e texturas que encontrei é rica e variada. Há tons de amarelo, como seria de esperar, mas também de verde, encarnado e violeta, como mostram as campainhas acima, que mais parecem turistas perdidas da Primavera.

Folha amarela

Tirei dezenas de fotografias ao longo de dois curtos passeios no sábado e no domingo. Se não fosse a constipação que me sequestrou esta semana, teria voltado mais vezes. Há ali um espetáculo íntimo de pormenores e contrastes a decorrer que recompensa o passo lento e olhar demorado.

Cogumelos junto a árvore

Já mesmo a terminar o segundo passeio, dei por mim a estranhar não ter encontrado cogumelos a crescerem. É uma floresta rodeada pela cidade, mas uma floresta mesmo assim. Bastou dar mais uns passos para descobrir estes três amigos à sombra de uma árvore. São os primeiros que alguma vez fotografei (já com muita pouca luz e alguma vegetação pelo meio) e os únicos que encontrei neste dia.

Filhas do vento

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O jardim da Gulbenkian é uma espécie de atalho de estimação para chegar a qualquer sítio na cidade, mesmo que o meu destino não fique nas redondezas e, na realidade, passar ali implique desviar-me do caminho mais direto. Quem disse que um atalho tem de ser necessariamente o caminho mais curto entre A e B?

Numa das últimas vezes que atalhei caminho por lá, tropecei nesta pequeno aglomerado violeta a absorver os últimos raios de sol da tarde.

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Uma pesquisa no Google revelou que se tratam de anémonas-do-japão e mais um blog deslumbrado com exatamente as mesmas flores na Gulbenkian. Vale a pena visitá-lo para contemplar as suas fotografias e ler a sua explicação para o nome anémonas (do grego filhas do vento).

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Estive quase para deixar estas anémonas esquecidas na memória da câmara, até que vi este bonito post da MJP, que me levou a atualizar o blog e, pelo meio, deu a conhecer o nome de mais uma flor e outro blog para subscrever. As flores virtuais não desprendem pólen, mas podem libertar inspiração.

O dia de um escrutinador

Mesa de voto

Lembro-me de ver, há uns anos, a notícia de que o antigo presidente Jorge Sampaio havia sido agente eleitoral numa mesa de voto em Lisboa e de ter ficado impressionado com o exemplo. Eis um homem que foi eleito diretamente pelos portugueses para o cargo mais alto da nação sentado a uma mesa a verificar bilhetes de identidade. Isso diz muito da humildade democrática de Jorge Sampaio, mas também do nosso sistema democrático, em que alguém pode ocupar duas posições tão diferentes e dependentes uma da outra. Não esqueci esse exemplo de cidadania, que foi o que me inspirou (isso e a leitura recente do livro de Italo Calvino cujo título tomei de empréstimo neste post) finalmente a fazer o mesmo, quando vi o anúncio no facebook da abertura das inscrições para agentes eleitorais na minha junta de freguesia.

Inscrevi-me em agosto, sem esperar ser chamado, e recebi uma carta algumas semanas depois a convocar-me no dia das eleições como membro de uma das mesas de voto da minha área de residência. Na carta, fui nomeado secretário, que tem algumas funções previstas, mas que, pela minha experiência, é considerado um membro suplente da mesa, que auxilia e substitui um dos outros quatro membros da mesa quando precisam de se ausentar (para almoço, descanso ou para irem votar). Há poucas regras e as mais específicas visam sobretudo os membros com mais responsabilidades (o presidente e o vice-presidente da mesa). Pelo que ouvi, é possível que alguém que esteja a participar pela primeira vez numa mesa de voto possa ser nomeado presidente de mesa, mas penso que essa pessoa recebe alguma orientação prévia por parte da junta de freguesia (e se não receber, os outros elementos da mesa podem e devem ajudar).

O meu domingo começou às 7h da manhã, hora indicada na carta para comparecer no local de voto. Depois das apresentações recebemos uma pequena orientação por parte dos membros mais veteranos. Não existe nada de complicado nas operações da mesa e a papelada que temos de preencher delineia praticamente tudo o que é preciso fazer depois da votação terminar e do escrutínio dos votos estar feito.

Dos cinco membros da nossa mesa, só eu e uma das escrutinadoras (as pessoas que verificam o nome do eleitor no caderno eleitoral) estávamos ali pela primeira vez. Ter ali gente simpática que sabia o que era preciso fazer ajuda imenso, mas o principal ingrediente é mesmo a transparência e o necessário acordo de todos. Na nossa mesa não ocorreu nenhum protesto ou incidente, mas o meu conselho, para quem se meter no mesmo, é que encarem todo o processo com sentido de responsabilidade, claro, mas sem excessiva gravidade. Há cinco pessoas presentes, e as contas têm de bater certo em algum ponto, pelo que é muito difícil imaginar alguém a conseguir sabotar o processo. 

A parte mais exigente da minha experiência foram as duas ou três horas que fiquei a substituir uma das escrutinadoras e a consultar os nomes dos eleitores inscritos nos cadernos eleitorais. Os nomes estão ordenados alfabeticamente, pelo que inicialmente parece ser uma tarefa fácil ⁠⁠— até que o ritmo dos votantes começa a aumentar e damos por nós a procurar nomes afastados por dezenas de páginas. Eram 50 páginas com centenas de Carlos e Catarinas. Quando finalmente pensamos que temos um método ótimo para descobrir mais rapidamente cada nome, surge uma Cíntia ou um César para nos despistar novamente.

Felizmente, a pressão está toda na nossa cabeça, e podemos levar o tempo que precisarmos para nos certificarmos que não assinalamos a pessoa errada (se os dois escrutinadores fizerem esse erro, isso pode depois, no pior cenário, impedir um eleitor com o mesmo nome de exercer o seu direito). É algo de que me vou lembrar, da próxima vez que for votar e estranhar a demora na fila.

E, sim, mesmo com toda a atenção do mundo, de duas pessoas com dois cadernos e tabelas numéricas idênticas (para ir riscando o número de eleitores que já votou), auxiliadas por uma terceira (o presidente da mesa, que lê o nome do eleitor e confere o número de identificação), vai haver discrepâncias, que depois é preciso sanar durante o processo de contagem e apuramento de votos. No nosso caso, entre os dois cadernos, surgiu a discrepância de um eleitor, que foi ultrapassada ao final do dia com a contagem dos votos na urna (que é o total que prevalece).

Ao longo de todo o processo, ninguém deu ordens a ninguém, ninguém ralhou com ninguém (mesmo quando, a meio do dia, nos apercebemos, pelas tabelas numéricas, que já existia a tal discrepância de um eleitor entre os dois cadernos). Foi um dos trabalhos em equipa mais descontraídos e igualitários em que participei, marcados por uma grande maturidade cívica e descontração, que me parecem ser ainda mais essenciais ali.

A contagem dos votos começou às 19h e levou uma hora e picos a fazer. Novamente, muita descontração, com cada membro a contar uma pilha de boletins de voto e a distribuí-los por lista, com validação e recontagem pelos restantes membros. A distribuição dos votos por um pequeno número de listas, e a ausência de discrepâncias, facilitou muito essa parte do nosso trabalho.

Para memória futura, aqui fica uma pequena amostra dos resultados da nossa mesa: dos 965 votantes inscritos, votaram 659 (68%). As listas mais votadas, da mais à menos votada: PS, PSD, PCP, BE, PAN, CDS e IL (as restantes listas receberam, cada uma, menos de 10 votos). Houve 14 votos em branco e 8 votos nulos, com destaque caricato para o voto dedicado ao Presidente do SLB…

Por fim, o momento mediático do dia, a minha breve troca de palavras com António Costa, na fila para votar. Já o tinha encontrado nas eleições europeias, pelo que sabia que votava ali, mas só ao chegar à mesa de voto é que descobri que ele seria um dos eleitores inscritos na nossa mesa. Estudei jornalismo, estagiei num jornal, já assisti a algumas conferências de imprensa e, mesmo assim, não me senti preparado para aquela quantidade de câmaras (ligeiramente) apontadas na minha direção — e olhem que eu pensei que ia escapar, por estar naquele momento a orientar as pessoas à entrada da sala, e não sentado à mesa.

O aspeto mais engraçado de tudo aquilo foi ver as reações durante a manhã dos outros eleitores ao aparato mediático instalado em volta da nossa mesa. Houve quem fizesse cara feia, claro, mas também quem estacasse de surpresa a meio da sala, sem saber imediatamente o que pensar daquilo. Os repórteres de imagem começaram a aparecer logo pelas 8h da manhã para marcar o lugar. Ainda deu para trocar impressões e sentir alguma camera envy (o fotojornalista da Getty Images, por exemplo, levava ao pescoço nada mais nada menos do que três enormes câmaras, só para registar o voto de alguém a menos de 2 metros de distância). Foi o momento mais animado do dia e valeu pelas mensagens dos amigos que me reconheceram na televisão e em alguns memes tótós que circularam (pouco, espero) nas redes. A fotografia no topo deste post foi feita à minha frente, já depois de António Costa ter votado. Não consegui encontrar a referência ao fotojornalista que a tirou, mas mostra bem a descontração que marcou o nosso dia ali.

De resto, houve muitos momentos bonitos entre pais e filhos. O mais bonito foi ver um senhor de 99 anos a entrar na sala de aula, acompanhado da filha (ela própria já na terceira idade), para votar. Caminhava com o auxílio de muletas, e com o ar de quem está um bocado longe dali, mas votou. “É teimoso”, dizia-nos a filha, enquanto esperávamos que o senhor votasse na cabine. E não pelo motivo óbvio: ele tinha preferido deixar os óculos em casa.

Vale a pena ainda assinalar que aquelas 14 horas (das 7h da manhã até ao fim da contagem dos votos da nossa mesa) como agente eleitoral foram remuneradas e que hoje tenho o direito a gozar um dia de folga do trabalho.

Não fiz nada de especial para ali estar e a minha experiência diz-me que a nossa democracia continua em boas mãos, precisamente porque também pode estar, por necessidade e/ou mero capricho da curiosidade, nas nossas.

Outubro

Habituei-me a ler, no primeiro dia do mês, os planos da Rita para o mês que se segue, e acho que é daí que veio a inspiração para esta vontade súbita de partilhar aqui os meus planos para outubro. É mais apto, porventura, falar em motivos de entusiasmo, porque não são bem planos fechados, mas se inspirar mais alguém, já fico feliz.

  • Uma experiência nova: vou ser agente eleitoral nas eleições legislativas do próximo domingo e não sei o que esperar. Depois tenciono contar tudo aqui, claro;
  • ViagemFestival de Cinema Francês, 3 a 13 de outubro: o cinema conta como viagem, certo?
  • Aprender: comecei em setembro e este mês vou continuar a frequentar algumas aulas de desenho numa associação cultural perto de casa. Está a ser um desafio mais difícil do que esperava, mas é um desafio bem-vindo à criatividade e à minha capacidade para me afastar de um ecrã por mais de uma hora acordada. Não sei bem onde é que isto vai dar, mas já fico satisfeito se for o começo de algo (um hobby, um caderno de desenho, etc);
  • Teatro: gostava muito de conseguir assistir a este Crime, disse ela, e de fazer uma visita a esta Ibsen House.
  • Livros: este mês ando a passear pelos Jardins de Lisboa, de Ivo Meco.

Se tiverem sugestões ou ideias, venham elas.