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horizonte artificial

ideias e achados.

Uma frase de Susan Sontag

"A memória é, dolorosamente, a única relação que podemos ter com os mortos."

A frase é de Susan Sontag e do seu brilhante ensaio sobre o poder da fotografia, intitulado Olhando o sofrimento dos outros. É mesmo um ensaio brilhante, porque nota-se que é um texto que surge como a procura de um posicionamento mais ético em relação às imagens. Admiro qualquer pessoa que tem esta capacidade para parar e colocar-se a si própria em causa. Uma espécie de "Estou a fazer isto bem? Haverá outra forma de agir e pensar em relação a este assunto?".

Quase não passa uma página do livro de Sontag sem que tenha de guardar uma frase, mas a frase acima fez-me estremecer, por fazer tanto sentido para mim e abrir uma série de caminhos que ainda preciso de fazer na sequência da morte do meu pai. No fundo, e falando claro, ao fim de quase dois anos desde a sua morte, desenvolvi este receio de perder também essa relação com ele, se não trabalhar mais as memórias que tenho dele. Isso passa por falar mais dele, e não menos, por confiar recordações à escrita e, sim, falar com ele.

A frase de Sontag tem essa dupla valência para mim. Por um lado, sublinha a necessidade de estimar a nossa memória. Por outro, penso que atribui um significado um bocadinho restrito demais ao exercício da memória, que não se limita à consulta de recordações. Recordar também passa por atualizar e reforçar memórias.

Falar em público

Ontem ao final da tarde fiz algo que já não fazia há bastante tempo: falei em público. Aconteceu num encontro do Clube de Leitura da Cocó na Fralda. Acompanho o blog da Sónia desde que se mudou para o SAPO Blogs e há já algum tempo que sentia curiosidade em relação ao clube. Ontem, finalmente, consegui aparecer e quase derreti com a simpatia com que fui recebido por todas as participantes. Era o único homem no grupo e, aparentemente, o primeiro a aparecer sozinho numa sessão, o que me surpreendeu.

Nunca tinha participado num clube de leitura, mas gostei do formato adotado, no qual cada participante faz uma breve intervenção sobre um livro que tenha lido recentemente. É um formato informal e descontraído que me parecem ser o cunho da própria Sónia como anfitriã e moderadora. Quando chegou a minha vez, não consegui deixar de sentir aquela vertigem que surge com o desafio de falar em público, mesmo tratando-se de um grupo pequeno de pessoas. Acho que atabalhoei um bocadinho as palavras, mas a experiência foi positiva. Se sentem falta, como eu, de mais conversas e encontros à volta de livros, em que se possam trocar impressões e sugestões de leitura, recomendo vivamente que fiquem atentos ao blog da Sónia e apareçam numa futura sessão. Até há bolo...

E o livro que levei comigo? Foi o A Cultura Mundo, de Gilles Lipovetsky e Jean Serroy, dois filósofos interessados em analisar e enquadrar o tempo em que vivemos, as forças que o atravessam e os seus efeitos na vida em sociedade. Gostei de o ler porque faz um excelente retrato da nossa época, sem cair no pessimismo e deixar de apontar algumas possíveis respostas às difíceis questões que ela nos coloca.