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horizonte artificial

ideias e achados.

A ponte no horizonte

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 A ponte, vista a partir de Almada. Janeiro, 2018.

 

Terminei de ler há dias "A Ponte Inevitável", de Luís F. Rodrigues, sobre a história da ponte 25 de Abril. É uma leitura, lá está, inevitável para qualquer pessoa que ainda guarde um certo espanto com a escala deste gigante de aço sobre o Tejo.

O livro traça o início da história da ponte ao século XIX, à primeira proposta de uma travessia entre Lisboa e Margem Sul. Vale a pena ficar a conhecer as diferentes ideias que gerações de políticos, engenheiros e projetistas tiveram em relação à localização e configuração que essa travessia podia vir a ter. Estes estudos mostram como, apesar do seu carácter inevitável, esta também foi uma ponte sucessivamente adiada. A sua construção, na década de 60, juntou essa vontade antiga de unir as duas margens à moderna engenharia do século XX, a mais bem preparada até aí para ambicionar realizar mega-construções.

A história da ponte não acaba com a sua inauguração em 1966. O fim do Estado Novo, o crescimento urbano e a sua manutenção ao longo das décadas foram colocando novas necessidades à estrutura, que o autor aborda recorrendo a várias perspetivas, da história ao urbanismo. Não consigo resistir, todavia, a isolar aquela que mais me agradou encontrar neste livro e que mais impressiona no dia-a-dia da ponte: a estética. Um pequeno exemplo:

“Relativamente à luz, existem aspectos que passam mais despercebidos, nomeadamente, que a experiência estética da ponte é diferente conforme a localização do observador: em Lisboa, olha-se para uma estrutura a sul, ou seja, mais intensamente banhada pelo reflexo da luz do que em Almada. A sensação de desfrutar do pôr-do-sol através da ponte é uma experiência exclusiva de quem a vislumbra a partir do nascente.”

 

A partir do Cais das Colunas

A ponte, vista a partir do Cais das Colunas. Dezembro, 2017.

 

Falar sobre a ponte 25 de Abril sem mencionar o seu estatuto icónico no horizonte de Lisboa resultaria inevitavelmente numa abordagem incompleta à sua estrutura e importância. E uma maneira de tratar esse tema passa por abrir o Instagram. É citado um estudo académico que procurou identificar os monumentos e locais da cidade de Lisboa mais vezes referidos na plataforma:

“Se reduzirmos a lista das suas preferências a elementos monumentais singulares, a Ponte 25 de Abril está inevitavelmente incluída no Top 10 das referências mais importantes da área metropolitana de Lisboa (...). As características deste tipo de informação permitem ainda saber, com exactidão, quais os meses do ano e as horas do dia em que a Ponte 25 de Abril foi mais referenciada/fotografada. Assim, a visualização da infra-estrutura portuguesa atinge picos em Março e Agosto - meses típicos de presença turística em Portugal (...). Relativamente às horas do dia em que a travessia é mais escrutinada pelos turistas das redes sociais, o período da tarde destaca-se claramente dos demais. Dado que o pôr-do-sol em Agosto acontece entre as 20:00-20:30 horas, não será de surpreender que os turistas optem por captar imagens prévias a esse momento - pelo que o período das 19:00 é o mais concorrido a nível fotográfico.”

 

Terreiro do Paço

Terreiro do Paço. Janeiro, 2017.

 

Fascina-me esta ideia de poder tentar medir o número de vezes que um objeto, mesmo um tão grande quanto esta ponte, é visto e registado. Subjacente a isso está a premissa de que fotografamos o que valorizamos. E o que tanto nos impressiona na ponte 25 de Abril? É a sua escala? A harmonia estética da sua geometria? É a geografia em que se encontra? É a vigília sobre as águas do Tejo das duas torres gémeas? Ou é a tensão viva das suas linhas? E que formas ou figuras são convocadas pelo seu desenho? Há muitas maneiras de investigar a ponte e de coleccionar respostas a estas perguntas. O livro "A ponte inevitável" é uma delas (e muito boa na forma como o faz). A arte é outra (estou muito curioso para ir ver ouvir a Shadow Soundings, por exemplo). A minha maneira favorita, mesmo assim, e aquela que está ao alcance da maioria de nós, ainda é a fotografia.

 

Cais das Colunas

Setembro, 2017.

Uma fotografia de 2017

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Ia dar o título "A minha fotografia preferida de 2017" a este post, mas reconsiderei, porque há duas ou três fotografias que competem na minha cabeça por essa distinção. Prefiro destacar uma delas e deixar o tempo desempatar a questão. A fotografia acima foi tirada na tarde de 25 de abril, junto ao Cais das Colunas, e é uma das minhas preferidas porque é uma das fotografias mais "intencionais" que tirei este ano. Estava de passagem pela zona e tive apenas segundos, ao espreitar por cima do ombro, para ver e reconhecer algures no fundo da minha memória fotográfica esta cena. Ou seja, soube imediatamente que estava a fazer uma cópia de outra fotografia tirada algures no tempo, e que tropeçara, por assim dizer, num clichê fotográfico — um postal lisboeta de Cartier-Bresson. É esse pensamento rápido, que permitiu passar do reconhecimento ao disparo em poucos segundos, que me faz gostar tanto desta fotografia, mesmo não sendo a mais original que fiz ou aquela com mais ressonância pessoal. Estou mais habituado a escolher uma cena qualquer, fazer uma série de disparos e a confiar na sorte. Um disparo assim tão intencional, no meu caso, é extremamente raro e, por isso, um dos que mais guardo na memória de 2017. Que 2018 seja, para todos, um ano propício a encontros certeiros destes, entre a nossa capacidade e vontade.