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horizonte artificial

ideias e achados.

1 ano

Custa a acreditar que já passaram doze meses, cinquenta e tal semanas e 365 dias. Hoje, ao olhar para trás, parece-me só terem passado duas ou três semanas. O planeta realmente continuou a girar e a completar a sua volta ao sol, mas, em alguns aspectos, ainda me sinto parado no exato ponto em que me encontrava há um ano.

Aquilo de que guardo dos primeiros dias deste ano é a onda de amor que nos envolveu a todos. Foi esse calor humano que me sustentou e que me esforcei por retribuir nestes últimos doze meses, no meu dia-a-dia, nos meus projetos e vida pessoal. Até na rua, naqueles momentos em que sentia impaciência com algo ou alguém. Não estive sempre à altura, e às vezes bem abaixo do que era esperado de mim, mas resta continuar a tentar.

O blog acabou por ser o elo mais fraco este ano, com um mínimo "histórico" de 13 posts. Levou algum tempo a voltar a sentir aquela vontade de atualizar esta página, e é uma pena, porque houve muitas coisas boas de 2017 que ficaram por contar e destacar aqui. Fica a minha gratidão a quem comentou, subscreveu e continua desse lado a ler e seguir o meu olhar. Espero que estejam todos bem e que nos voltemos a cruzar em 2018.

Dez livros de 2017

Escrever sobre os livros que leio é um exercício que não devia fazer apenas uma vez por ano. Seja como for, aqui ficam alguns dos livros que me fizeram boa companhia (no metro, na pastelaria e junto ao rio) em 2017.

 

Escrever: memórias de um ofício, Stephen King

King é o escritor que mais li até hoje. O homem tem uma imaginação fértil para criar situações únicas de impasse que depois resolve com uma mistura muito própria de talento, inteligência e humor. Este ano voltei a ler mais dois ou três livros dele, incluindo este “Memórias de um Ofício”, onde conta o seu percurso como escritor e partilha alguns conselhos para escrever bem. Como o próprio admite, nada do que ele revela irá surpreender quem já lê por hábito, mas o importante é a maneira como o faz, com carisma e sem falsas promessas ou réstia de presunção (para quem já vendeu milhões de livros). Uma analogia particularmente bonita que encontra para descrever a magia da escrita é a telepatia, como forma de transmitir pensamentos no tempo e no espaço a outra pessoa. Quando pensava que já não podia ficar mais interessado nesta obra, cheguei ao último capítulo, onde King relata o célebre atropelamento de que foi vítima em 1999, precisamente na época em que escrevia este livro. A escrita, e a vontade de terminar estas páginas, ajudaram-no a enfrentar a longa e dolorosa recuperação que se seguiu.

 

O Casamento, Nelson Rodrigues

Comecei por ler as suas crónicas e fiquei impressionado com o afiado sentido de ironia deste escritor brasileiro. Foi por isso que decidi dar-lhe mais uma oportunidade e procurar um dos seus romances. Bastou ler algumas páginas deste Casamento para ser novamente apanhado desprevenido pelo seu estilo mordaz. Um dos poucos livros deste ano que me fizeram, aqui e ali, rir em voz alta.

 

Uma história da leitura, Alberto Manguel

Um apanhado geral da história da leitura, bem escrito e organizado. É aquele tipo de livro que elogia secretamente qualquer leitor obsessivo, por confirmar a vantagem do seu ponto de vista do mundo.

 

O Capitalismo Estético na Era da Globalização, Gilles Lipovetsky e Jean Serroy

Confesso: escolhi este livro pela capa, que me intrigou pela sobreposição do título com a fotografia de dois requintados bolos que podiam ter saído da vitrina de qualquer pâtisserie. O que é que a pastelaria francesa pode ter a dizer sobre o capitalismo e a globalização? Lipovetsky e Serroy procuram mostrar como a estética, ao serviço do capitalismo, impregnou todas as esferas da atividade humana, com todo o tipo de consequências e possibilidades associadas. Sinto que é uma leitura útil para decifrar e questionar o tempo em que vivemos.

 

O declínio da mentira, Oscar Wilde

Um manifesto artístico que exalta o direito e o dever do artista a inventar, a sair de si e a não ficar preso ao que a sua época valoriza e legitima. É um texto magnífico, muito fácil e rápido de ler, que autoriza a pensar e a criar mais alto.

 

A Flor Amarela, Anabela Mota Ribeiro

A Anabela teve a oportunidade, no âmbito da sua tese de mestrado, de reler e trabalhar um dos seus livros preferidos, o romance “Memórias póstumas de Brás Cubas”. O resultado é um pequeno livro igualmente fascinante, que bebe de várias fontes para pensar e abrir a obra de Machado de Assis a mais leituras. Um trabalho intelectual marcado pela distinta sensibilidade e inteligência da Anabela. É um livro sobre outro livro, o que significa que é uma recomendação que vale por duas.

 

Lolita, Vladimir Nabokov

A grande revelação do ano para mim. Sempre ouvi falar da “Lolita” de Nabokov, mas nada me preparou para a surpresa que tive com este livro. Entrar na mente de um pedófilo e manter o leitor interessado naquele limiar entre a lucidez e a patologia é um feito considerável. Nunca li nada assim e desconfio que não voltarei a ler.

 

Street Photography Now, Sophie Howarth e Stephen Mclaren

O melhor livro que consultei este ano sobre fotografia, com excelentes conselhos, depoimentos e reflexões de fotógrafos de todo o mundo sobre essa vontade de ir para a rua com uma máquina e tirar fotografias a estranhos nos seus afazeres diários. O principal mérito do livro é expandir a nossa ideia do que pode ser street photography, num mundo que apesar de estar cada vez mais ligado e parecido, continua a oferecer vislumbres inesperados de descoberta, beleza e tensão a quem está disposto a observá-lo.

 

O Tumulto das Ondas, Yukio Mishima

Se pudesse colava aqui as primeiras 5 páginas deste romance. Foi uma das minhas primeiras leituras do ano e continuo com a imagem (e é mesmo imagem) bem presente da ilha onde a história acontece. Nitidez é a melhor palavra que me ocorre para descrever o estilo de Mishima.

 

Tudo é fatal, Stephen King

Depois da desilusão da trilogia "Bill Hodges" não contava voltar tão cedo aos contos de Stephen King, mas cruzei-me por acaso com este "Tudo é fatal" e não resisti à citação na contracapa do conto "Sala de autópsias número quatro". Como é que o autor ia resolver uma situação destas, em que o protagonista acorda paralisado e dá por si prestes a ser autopsiado vivo? A premissa é brilhante e o seu desenvolvimento é de deixar qualquer leitor preso à página. O encontro com "O homem do fato preto" é assombroso e astucioso na forma como explora o medo da solidão na natureza. "Tudo o que amamos nos será tirado" é um título brilhante e o mote a uma das histórias mais caricatas do livro. "Tudo é fatal" dá o nome ao livro e fornece o enredo perfeito para uma mini-série televisiva. Por fim, "1408" é fantástico, sobretudo pelo jogo de antecipação do que o protagonista dessa história irá encontrar ao abrir a porta do quarto de hotel com o número 1408.

O palco mais impressionante de Lisboa

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A fotografia é de janeiro, da tarde em que encontrei o Acácio e o Warren a levantarem voos com as suas guitarras no Miradouro da Nossa Senhora do Monte. Os dois formam os Port du Soul e descrevem a sua música como "uma fusão de Fado e Folk nascida nas ruas de Lisboa". O resultado é mesmo muito bom e pode ser escutado aqui sem compromisso. O meu tema preferido é o terceiro ("Lap Lighter vs Braveheart"), o único que ouvi ao vivo naquela tarde e no qual as duas guitarras se lançam numa perseguição desenfreada uma da outra. Eles têm pelo menos um concerto marcado este mês, mas continuam a tocar na rua e a dar música à cidade.