Não gostar de poesia
Escreve Nuno Artur Silva, numa crónica sobre Lisboa e verões passados:
Há um amigo meu que não gosta de poesia. Diz que ouvir poemas, para ele, é como ouvir números. “ Eu vi a luz em um pais perdido”: 33, 22, 7, 423. “E busque amor novas artes, novo engenho”: 93, 44, 2, 113.
Imagino-o, um dia, a ler, por acaso, um poema “É ferida que dói e não se sente”: 24, 13, 5, 1001, desinteressado e distraído, um texto que nem seja um poema, um texto donde lhe venha, inesperado e fulgurante, um verso que ele ganhe como quem ganha a lotaria, como o número de uma lotaria íntima, o segredo do cofre onde ele guarda a sua secreta poesia privada.